segunda-feira, 30 de junho de 2008

Um sempre no nunca

Um dia, enquanto buscava frases aleatórias no Google que pudessem me despertar da insalubridade, a qual o tédio expõe muitas vezes os nossos ossos, li rapidamente algo do tipo: a vida não é feita de acertos e de erros, mas de percepção e ocultamento do que queremos.
Honesto, não? Na verdade, não é que erro, só me oculto, e ainda, não é que acerto, mas percebo a possibilidade de validar o que quero. Parece simples, bem simples, é só afinar o instrumento potente que é a nossa racionalidade, estufar o peito, soprar a poeira dos devaneios e encontrar um belo peixe prata com o rabo dourado nos olhando fixamente ao centro de nossa consciência: Me pegue! Vamos, me fisga!
E é aí que tudo começa: não é para mim que ele está olhando! Ou melhor: Humm... Meio duvidoso o jeito como movimenta as barbatanas! E ainda: Ih, a água dessa lagoa me parece tão gelada! Aliás, qual será a profundidade? Aquilo é um redemoinho? Posso morrer! E ternamente: Para que tirá-lo de lá, não devemos maltratar os animais! Fora que, se amanhã eu estiver com o Fulano, ele colocará a isca certa para pegar o peixe...
O coração escancarado, desejoso, dá o verdadeiro grau da vida: zero. Não agüentamos o que nos coloca em evidência e rapidamente névoas de pensamentos, impressões e emoções nos oculta de nós mesmos, até que um dia ao passarmos em frente a uma megastore de brinquedos, sacamos o nosso cartão de crédito e compramos uma réplica de plástico de um peixe, sem precisarmos ter entrado na água, sem passarmos pelo medo de nos afogar e sem experimentarmos o gosto metálico da frustração de tudo se tornar um nada. Mas a teimosia é tanta, que a euforia nos salva e voltamos para casa crentes de que sabemos dar felicidade a nós mesmos, abrimos a porta, vamos até a mesa da sala e colocamos o brinquedo sobre ela: vamos meu amigo, dance! E ele dança! Cante, e ele canta! Na hora de dormir, a melancolia nos invade, choramos e acreditamos não saber o porquê: o que há de errado comigo? Pago impostos e sou educado com estranhos! E o peixe prata de rabo dourado volta à profundeza de onde demorará um bom tempo para retornar.
Mas há pessoas que percebem o peixe, mas que ignoram o mistério que transpassa o seu olhar, o que dá na mesma de não percebê-lo e assim, banalizam tanto a experiência que num mesmo samburá carregam o peixe prata com rabo dourado com os que vivem em lamaçais, até que na hora de despejá-los no tanque não reconhece a diferença entre os demais e automaticamente sente-se poderoso diante da quantidade. Porém, a história que começa a ser tramada é a de um solitário destino.
Nos dois casos ocultamos e, portanto, erramos. Voltamos ao degrau debaixo, quando estávamos alavancando para um novo lugar em nós mesmos, que estava prontinho para ser vivido e significado, fecham as portas para só depois de muito tempo tentarmos novamente penetrar nesse espaço.
Agora, há quem percebe o peixe e o reconhece: você por aqui? Mas tão já? Suas barbatanas na são como eu as imaginava, mas ainda assim são bonitas! A lagoa é profunda, mas vou até ai, gosta dessa isca? Consigo te tirar sozinho daí, aliás, somente eu conseguiria, seu olhar canta aquilo que sempre soube e me preparei gradativamente para reconhecer.
Bum!: e o acerto nos alavanca àquele lugar que desconhecíamos e ansiávamos penetrá-lo, vivemos o novo, além das aparências, absorvendo a essência do que se ama ou de quem se ama, sem nos tapearmos com réplicas do que queremos, ou por medo fingimos não termos mais esperança e banalizamos o chamado, ignorando que estávamos um passo de sermos felizes.
Erro ou acerto? Ora um, ora outro. Errar não é tão difícil assim, mas acho que é uma obrigação buscarmos o que nos faz bem, não importa o que seja ou quem seja, até entramos na dinâmica do espiral da nossa vida e descobrirmos que acertar é fluir, perceber e optar, evitando o desconforto de ignorarmos o que nos incomoda: os peixes dourados prontos para serem fisgados.