segunda-feira, 29 de agosto de 2011

VERMELHO

Imagem, ação:
tropecei nas fitas de cetim 
que estancavam
o sangue do coração.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

DESPEDIDAS

No momento da despedida, um breve 'te cuida!'. Aliás, sempre foi assim e sempre será - com todos nós, basta estarmos unidos uma vez, para logo nos separarmos. Isso me parece injusto: na fricção do ir e vir a solidão resplandece como uma nesga de luz que se esgueira da porta de um templo.Até mais? Sim, até mais. Mais é soma de algo com o seu devir. Então voltaremos a nos ver? É o que todos desejamos. Nossos pais nos esperam voltar para casa, quando os deixamos sozinhos com suas solidões esquecidas, encobertas com a poeira dos seus carinhos. Nessa perspectiva, eles me parecem santos banhados em graça: doaram a si mesmos para nós, a fim de que vaguemos como caravelas em  mares - ora cheios de tormenta, ora cristalinos a ponto de conseguirmos ver nossos reflexos.
Não gosto de despedidas, mas aprendi a suportar aquilo que me escapa: a dança do ir e vir da Vida. Os barqueiros milenares da Índia compreenderam essa intermitência exaustiva, contemplando os rios. Mas, na cidade onde eu moro, o rio é distante e sujo. Não consigo aprender nada com ele. Dizer que os momentos compartilhados são especiais é fácil quando os observamos em cima do muro da contemplação. Mas, infelizmente, na precariedade de minha condição humana, só posso oferecer um 'Até mais!' Para mais e mais...

terça-feira, 16 de agosto de 2011

TALISMÃ I

Cavalo prateado
subindo a encosta
da montanha
dos meus sonhos.

Diria apenas:
esperança reina -
miosótis se espalham
na alameda de nossa cumplicidade.

Ao meu redor,
as crianças
contrabandeiam
angústias inacessíveis.
Dou-lhes borboletas alvas,
para guardarem
em pequenas caixas
de veludo grená.

(Paraíso é fazer do outro o seu labirinto predileto).


Haverá sempre salvação,
enquanto os corações
se chocarem  à deriva do amor.


Vamos, meus pequenos!,
há jardins fabulosos para cuidarmos:
aqui, seremos mudos como os sábios,
cristalinos como as larvas, astutos como os cervos
e telepáticos como os golfinhos.

Não teremos mais medo
de voltarmos à nossa terra natal.

domingo, 7 de agosto de 2011

ODE ÀS FORMIGAS!

Esses dias fiquei refletindo sobre as formigas. Isso mesmo: as formigas, aquele inseto que é o gênero animal de maior sucesso na história terrestre, constituindo de 15% a 20% de toda a biomassa animal terrestre. Era tarde e já estava me preparando para rezar, quando vi dentro dos vasos de flor algumas formigas mortas. Elas tinham se afogado e estavam boiando na pequena superfície d´água e então me veio à mente a seguinte pergunta: - O que se passa no coração de uma formiga? Sorri, primeiramente, pois imaginei um coração tão pequenino que seria impossível vê-lo a olho nu; depois, sorri novamente, porque, no fundo, estava me referindo a um coração não somente como um órgão físico de um determinado corpo vivo, mas como símbolo de toda experiência anímica. Dei mais risadas. Na verdade, não sei se a formiga tem um coração e me faltou motivação para fazer uma pesquisa a respeito do corpo desse inseto, mas não importa, pois o que é verdadeiramente relevante nesses devaneios é a imagem de um pequenino coração com toda sua determinação pulsante. Pois é. Fiquei, admiravelmente, chocada com o fato de arriscarem suas vidinhas, desbravando locais perigosos, como os vasos de flores cheios d´água, que ficam em apartamentos de meninas solitárias e sonhadoras, em busca de alimentos. Será que não percebem que podem morrer nesse tipo de empreitada? Acho que não. Nos seus coraçõezinhos, só cabem determinação e servidão, pois a formiga rainha espera o ganhos conquistados pelas operárias para a manutenção do formigueiro. Senti pena e admiração por aquelas formigas mortas e por um tempo suspendi os meus afazeres, como rezar e voltar a estudar, para compreender melhor a minha estupefação com relação àqueles insetos. Nossa! No fundo, eu invejava as formigas, pois sem titubear suas vidas tinham um sentido tão claro e pulsante que nada, ao longo da História, desde tempos remotos, pré-históricos, iria impedi-las de continuarem perseverantes em existir. Haveria formigas depressivas? Rebeldes contra a eussocialidade (O termo eussocial é conferido aos animais que apresentam as sociedades mais complexas)? Tristes por não serem correspondidas no amor? Preocupadas em perder o emprego? Sim, eu invejava as formigas. Suas mortes pareciam ter mais sentido quando comparada a dos homens, seres miseráveis, que muitas vezes passam uma existência inteira, sem conseguir ouvirem as vozes do seus grandes corações. Ah, vivam as formigas!

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

JARDIM: uma metáfora da alma

"O jardim é um vínculo concreto com a vida e a morte. Seria mesmo possível dizer que existe uma religião dos jardins, pois eles nos ensinam profundas lições espirituais e psicológicas. Qualquer coisa que possa acontecer a um jardim pode acontecer à alma e à psique  — excesso de água, falta de água, pragas, calor,tempestades, enchentes, invasões, milagres, ressecamento,reverdecimento, bênçãos, cura.
Durante a existência do jardim, a mulher escreve um diário, registrando os sinais de doação de vida e de retirada de vida. Cada registro ajuda a formar uma sopa psíquica. No jardim, adquirimos prática para deixar que pensamentos, idéias, preferências, desejos e até mesmo amores vivam e morram. Plantamos,arrancamos,
enterramos. Secamos sementes, fazemos a semeadura, protegemos as plantinhas.
O jardim é uma prática de meditação, a de dizer a hora de alguma coisa morrer. No jardim, podemos ver chegar a hora de desfrutar e a hora da regressão. No jardim, estamos nos movendo de acordo com a inspiração e a expiração da grande natureza selvagem, não contra ela".

Mulheres que correm com os lobos, Clarice Pinkolas Estés.