quinta-feira, 24 de dezembro de 2009
FOLHA DE BORDO
Eu que sonho que a moça é jovem
e é linda na bola vermelha de Natal.
O vestido dela é bonito que nem cisne.
O cisne flutua com suas plumas brancas, finas
quando sua cabeça macia de neve
flutua embaixo para ser como a neve de novo.
Então eu queria ser uma mulher como aquela uma,
ser com uma asa bem longa.
domingo, 20 de dezembro de 2009
DESPERTAR
Por alguns instantes, retornou a olhar-se, no espelho. O dia estava, extremamente, convidativo para um passeio primaveril. Mas decidiu ficar assim: admirando-se em seu próprio mistério. Lembrou-se, com certa vergonha e raiva, o que haviam dito para ela quando, aos 14 anos, ficava meditativa, em seu quarto, com dois livros intermináveis, os quais lhe traziam alguma dificuldade na leitura: Retrato do Artista quando jovem e Mrs. Dolloway, mas que os compreendia com o coração. Disseram asperamente: "Você se acha muito sabida, né? Onde pensa que vai aprendendo a não ser nada?". Queria fugir dali, daquele momento. Aquelas palavras continham apenas uma parte da verdade. De fato, ela não queria ser nada. Gostava da ideia de crescer como uma árvore frondosa, apenas cultivando para si bons sentimentos, pensamentos, ideais, não era ambiciosa como haviam lhe ensinado desde pequena. Mas como dizer isso às pessoas? Que desejava ser como as àrvores? A internariam, num hospício. Mas essa era a sua resposta para o mundo. Sentiu raiva de si mesma e de sua irmã, que havia lhe machucado com aquelas palavras.
"Será que saio para dar uma volta pelo bairro?". O rapaz que conhecera há pouco tempo prometeu ligar mais à noitinha, para irem ao cinema. Gostou dele. Era um rapaz simples, que poderia ser uma companhia interessante para os dias de solidão, mas ainda não era quem sabia que guardava dentro de si: o cara, que apareceu entre tantos e foi embora sem dizer nada, na festa, mas que sua presença a tranquilizava como uma lembrança da infância mais doce. E ele, provavelmente, nem lembrava mais dela, mas ela sabia onde ele morava, o que fazia e inclusive quem amava.
Penteou o cabelo. Estava comprido. Precisava cortar, ao menos as pontas. Decidiu fazer uma trança como as garotas de uma fotógrafa que gostava demais. O dia diluia lá fora e ela queria apenas ficar assim: gastando-se em si mesma, mas nada de embotamento, ao contrário era a celebração da sua solidão. Gostava de habitar-se na ilha que supunha-se ser. Mistério à parte, queria apenas tornar-se frondosa como um jequitibá. Imaginou a irmã entrando no banheiro e falando, novamente, para ela: "Você se acha muito sabida, né? Onde pensa que vai aprendendo a não ser nada?". Sentiu-se confusa e triste. Mas encarou-se, no espelho, e disse para si: "A sabida virou uma escritora." Na clínica, descobriu que o nome disso era complexo e que eles faziam parte do que somos e que deveríamos tomar uma posição de responsabilidade a eles. E ela devolveu ao mundo de maneira sábia o que lhe oprimia, no íntimo, com suas leituras e sua poética. Foi a saída de sobrevivência da alma."Será bom sair com esse rapaz, ao menos me distrairei. Preciso esquecer quem me fez esquecer de mim mesma. Como no filme: viver por amor e não morrer por amor". O penteado o agradaria? Pois não havia nada mais delicioso do que sair com um homem, sentindo-se bela, fresca e esperançosa. "É como quando pegamos os peixes, na beira do rio, e os colocamos de volta na água." Olhou seu corpo, no espelho, e concluiu que o tempo a fizera muito bem. Quando adolescente, não tinha consciência da sua beleza e sensualidade particular, nem da sua inteligência, daí viver introvertida, ensimesmada, inclusive, ridicularizando a si mesma e aqueles que a ameaçavam como os seus modos de viver. Sem tempo para o nada.
Agora, era outra, e o seu coração generoso desculpava quem lhe havia machucado, sem compreendê-la. Desde criança era tida como diferente demais e todas as tentativas de adequação, que fizera foram frustrantes: quando ensinavam a ela um jeito eficiente de escrever, ela vinha com um livro feito à mão; quando pediam para desenhar uma casa, ela desenhava uma cabana, no meio da floresta; quando pediam para costurar um botão, bordava um pássaro, no bolso. Demorou muito tempo para descobrir o que a fazia, realmente, feliz e tudo que tinha em mãos agora era simples e genuíno, forte como o café que fazia todas as manhãs.
Lembrou-se de um sonho que teve, em um período de emergência psíquica - pessoas ao seu lado, em um trabalho burocrático, ameaçavam sua vida criativa, impondo-lhe um jeito estreito de ver um problema a ser solucionado: à noite, quem apareceu para ela foi a cantora Nina Simone, que mostrava o caminho para safar-se dessa situação, apresentou-lhe um homem branco de barba ruiva como se fosse seu pai e que este estava traindo sua mãe, que arrumava uma cozinha, obsessivamente, com ela, a cantora de blues. Acordou sobressaltada, mas sentiu-se equilibrada.
"Não importa o tempo que levei para chegar aqui DENTRO de mim, cheguei." Maquiou-se devagar. Passou delineador, nos olhos, e um batom pêssego assentou-se à sua boca pequenina. Mudou de ideia, daria uma volta pelo bairro, compraria umas flores para enfeitar a casa e à noite daria chance a amar, novamente.
segunda-feira, 7 de dezembro de 2009
PRELÚDIO ÀQUELA QUE ME AGUARDA
sábado, 5 de dezembro de 2009
UM TIPO ESPECIAL
O marido a amava, demasiadamente, mas não a percebia, achava-a graciosa, espontânea e, em alguns momentos, suas excentricidades o envergonhava, mas ela era bonita e elegante o suficiente para ele se encantar até o fim de sua vida. Ela gostava de ler poesia. Ele via televisão. Ela gostava de perambular à toa pelo centro da cidade, de olhar, minuciosamente, para as porcelanas chinesas, adivinhando seus mistérios. Ele dormia depois do almoço. E assim se amavam, mas cada dia que passava desejava alguém com quem pudesse contar seus pensamentos, suas ideias, mostrar seus mimos, alguém que pudesse entendê-la e assim a fazer se sentir viva, reconhecida, na sua essência, que nem mesmo ousava explorá-la. Sentada, com as camisetas dos filhos no colo, fechou a gaveta e a passagem secreta foi bordar pásssaros, naquelas roupas de linho. Ficou assim: encantada, consigo mesma, no paliativo da criação, esperando, esperando voar para bem longe.
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
quinta-feira, 3 de dezembro de 2009
UN COEUR DU PETITE FILLE
Que desespero ter a consciência de saber que vivemos um breve sonho. Você não é quem eu imaginava que fosse e nem eu sou mais aquela que me tinha. O desdém vai se tornando cada vez mais feroz. No ponto exato da carne macia. Novos estranhos que acabam de se conhecer: ouçam! promessas de vida a dois.
Balela de amor!, disse com a boca cheia de bebida,
e eu que nunca fui tão certa de mim: sorri e voltei a delirar.
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
PENSAR... PENSAR...
terça-feira, 10 de novembro de 2009
VALEU A PENA?
segunda-feira, 9 de novembro de 2009
CANSADA DE PERGUNTAR: por quê?
A CEIFADORA
terça-feira, 3 de novembro de 2009
AMOTROPOFAGIA
Não sei que parte lhe oferecer, receio te entregar o meu fel: tristes morcegos que esperam o anoitecer, para se amarem escondidos e celebrarem a liberdade de suas naturezas. Continuaria me amando se mordesses essa parte? Amar é ficar com. E aguentamos ficar com, à medida que conseguimos ficar CONosco. Conheces teus morcegos? Sei que vou, com meus sentimentos e pensamentos, em lugares que poucos vão. Meu fôlego é o vento que soprou as caravelas, que vagaram o mundo, no passado, na expectativa de encontrar novas terras. Sou abissal. Continuaria me amando?
Mas sabes que não sou apenas isso, minha doçura infantil é o que lhe encantou. Uma ingenuidade que, sinceramente, nem eu mesma acredito que ela ainda resiste. Acredito e pronto. Sorriu e pronto. Queres essa parte? Não. Darei a ti o que senti, quando acordei ao teu lado. Foi uma festa descobrir-me em ti, enquanto dormia dizia a mim mesma: essa é a minha Verdade.
E então se ficares com esse pedaço de mim, a lembrança desse dia será, como fui, a pessoa mais feliz do mundo.
sábado, 31 de outubro de 2009
MOTIMISTÉRIO
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
OLHANDO PRA VOCÊS...
terça-feira, 20 de outubro de 2009
MÚSICA
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
domingo, 18 de outubro de 2009
Here comes the sun...
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
Henri-Cartier Bresson
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Um pequenino coração partido...
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
UM DOS MEUS DESENHOS...
Acho mesmo que o desenho está mais próximo das casas que o Tim Burton buscou expressar em O Peixe Grande do que os exemplos que citei acima. O importante é que fiquei satisfeita com o meu desenho. Saiu com a minha carinha. Tentei desenhar um entardecer e claro, uma grama para eu fazer de travesseiro e percebam: ali, no canto esquerdo, tem um carneirinho. Carpe Diem!
terça-feira, 6 de outubro de 2009
JORNADA DA ALMA
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
NA NOITE PASSADA...
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
ODE A CHARLIE
Então, hoje, quero apenas falar de Charlotte - minha gata.
Ela tem uma vida boa. Vejam, nesse momento a bichana está sobre a televisão olhando para fora da janela os pássaros que estão no telhada da casa vizinha. Não tem vontade de fugir? De cair no mundo selvagem da vida além apto.? Ela é como eu: tímida demais, inclusive chego a ser mais ousada que o pobre animalzinho, que quando percebe que estou ansiosa, começa a fazer xixi para fora da bandeja.
Ela é séria, doce, infantil, dengosa e arisca. Mas de todas as suas qualidades a que mais amo, além da sua fidelidade, é ser contemplativa. A gatinha para e fica olhando: o teto, os bichinhos e por vezes o invisível!
Acho que existe vantagens na monotonia do dia-a-dia - não disse apatia! - dá para curtir mais as pequenas coisas, os objetos da casa se envolvem de uma aura especial e a rotina pode se tornar uma grande aventura para quem tem um coração como o meu e o da Charlotte.
Parou de chover, mas não irei à Sumaré, me bateu uma baita preguiça e Charlie pende um dengo!
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
EU VOU...
quinta-feira, 3 de setembro de 2009
A chuva chegando...
domingo, 30 de agosto de 2009
UMA LONGA CAMINHADA
sábado, 29 de agosto de 2009
RODA DA VIDA
Acho que nisso tudo, descobrimos valores incomensuráveis como: a amizade, a família, o amor, a esperença, a fé, a compaixão, a alegria, a benevolência e claro: a ousadia - sempre. E nesses momentos é uma dádiva termos alguém que nos acolhe, que ri das nossas atrapalhadas e é nesse momento que descobrimos que não estamos sozinhos nesse mundão de meu Deus! Que tem uma torcida atrás de você dizendo: vai, você está quase lá... Lá?
Sim. Mais perto do seu sonhos, mínimos que sejam, mas valiosos e que só você sabe.
A vida é rica, cada dia é uma possibilidade de desabrocharmos e lidarmos com os nossos sentimentos de maneira diferente. O receio? Quem não tem? Mas faço dele o combústivel para a minha estrela dançar!
segunda-feira, 17 de agosto de 2009
Feeling Good
Assim, quando ouço Feeling Good, na voz de Nina Simone, minha alma parece transbordar, é como se viesse à tona a lembrança de um lugar desconhecido, mas sei que já o habitei e agora, estou a caminho de volta. Portanto, deem uma olhadinha na letra para verem se não tem tudo a ver. Se der, baixem a música, é linda.
Feeling Good
Birds flying high you know how I feel
Sun in the sky you know how I feel
Reeds driftin on by you know how I feel
(refrain:)
Its a new dawn
Its a new day
Its a new life
For me
And Im feeling good
Fish in the sea you know how I feel
River running free you know how I feel
Blossom in the tree you know how I feel
(refrain)
Dragonfly out in the sun you know what I mean, dont you know
Butterflies all havin fun you know what I mean
Sleep in peace when day is done
Thats what I mean
And this old world is a new world
And a bold world
For me
Stars when you shine you know how I feel
Scent of the pine you know how I feel
Oh freedom is mine
And I know how I feel
quinta-feira, 13 de agosto de 2009
O Oriente e a minha vida...
Na verdade, o ano passado todinho li muito sobre o budismo, visitei alguns centros de dharmas e templos, até que por fim resolvi praticar o culto aos meus ancestrais em casa mesmo, o qual é necessário a leitura do Sutra do Lótus para se obter as realizações e o desenvolvimento interno.
Acho realmente interessante o fato de me sentir mais próxima da sensibilidade do oriental - do asiático - do que do ocidental quanto à espiritualidade - mesmo tendo um pai, filho de japoneses -, pois, em casa, apenas o catolicismo era praticado por minha mãe que tem ascedência italiana.
Acredito que Deus é um só, assim como nós somos UM no que concerne às questões mais essenciais, mas quando tenho que pesar como responder ao Universo meu compromisso para com ele, acabo por reagir como uma asiática: as questões de carma, do bem e do mal, a Vida/Morte, as sucessivas existências, etc.
Assim, quando iniciei as aulas de Yoga, o cheiro do incenso, o Puja (transmissão de energia), os mantras, a música indiana e algumas passagens da filosofia da Vydia Yoga Asharam me soaram muito coerentes.
Os exercícios de respiração são fantásticos (os pránáyamas), assim como as posições psicofísicas (os ásanas) e a cada aula o estranhamento vai dando lugar a concentração e a sensação de bem-estar. Algumas contorções da coluna são um desafio, mas quando o corpo se encaixa e você para de lutar contra o sofrimento e o aceita com paciência - prestando atenção na respiração - você fica mais alerta a entender um pouquinho mais sobre si mesmo e o seu corpo.
Hoje, ao fazer uma posição, a lateroflexão, foi surpreendente como o meu corpo respondeu a ela. A professora foi até mim, forçou um pouco mais a contorção - pensei que ia morrer ! - até que de repente: puxa! Não é que estava me sentindo bem? E tornando-me consciente de que posso ultrapassar algumas barreiras? Que barato.
A aula termina com visualizações bem positivas, como a da aula passada que tivemos que imaginar um lugar que mais gostamos de ficar e ali fazermos algo que realmente gostaríamos de estar realizando.
É isso. Aí eu coloco os sapatos, dou tchau pro pessoal - até semana que vem... - vou ao supermercado e compro flores para colocar, no altar budista. E assim, o Oriente vai ganhando espaço, cada vez mais, na minha vida.
Namu Myôhô Rengue Kyô.
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
CONQUISTAS...
Em 2008, participei como técnica do projeto Prazer em Ler - Escolas Públicas, que tinha como objetivo capacitar professores, coordenadores e alunos como mediadores de leitura a partir de uma perpectiva cultural e não meramente alfabetizadora.
A experiência que tive foi tão rica, assim como os encontros com as pessoas durante esse ano, que seria uma grande burrada não transformar isso em mestrado. Então, pouco a pouco, após voltar de um longo dia de trabalho - pois fiquei responsável em acompanhar 9 escolas do extremo sul de São Paulo - esboçava sobre a minha escrivaninha os problemas relacionados à leitura literária, os quais gostaria de compreender, com mais profundidade, em uma pesquisa.
O fruto foi tornando-se maduro. Encorpado. Viçoso. Passei no mestrado, ampliei o projeto para concorrer a bolsa e, agora, graças a Deus, fui contemplada.
Acho isso tão interessante: a inquietação, nas aulas de literatura - sempre questionava alguns métodos - me levou a ser técnica do Prazer em Ler-Escolas Públicas, assim como aluna ouvinte no Programa de Linguística Aplicada da PUC/SP em leitura e letramento, para posteriormente confluir o conhecimento teórico com o prático, transformando-o em projeto de mestrado.
Uma coisinha dentro de outra que leva à outra e assim por diante... Como as bonequinhas russas que tanto amo!
Repito sempre a frase de uma pessoa, a qual tenho uma afinidade espiritual considerável: "O que é teu é teu, ninguém tira. Apenas te prepara para vivê-lo com sabedoria! Integra-te".
É isso. Não vejo a hora das aulas começarem. Da vidinha acadêmica desenrolar... Viver o que tenho que viver, aprender, ensinar.
Good Luck !
domingo, 9 de agosto de 2009
HISTÓRIAS...
sábado, 8 de agosto de 2009
TPM...
Aí, eu paro: recomeço. Suspiro. Charlotte me olha aflita. Vou à cozinha, preparo um café, de repente escuto alguém me chamando no msn: vai ao sair hoje à noite, ou não? Ai, quanta indelicadeza! Vai sair hoje à noite, ou não? É necessário expressar-se assim?
Dizem que sou sensível demais. Carente demais. Espero demais. Vivo demais. Exagero demais. Mas puxa!: custa um: oi? você está bem? faz tempo que não te vejo, gostaria de lhe ver hoje à noite... Enfim, sou do time que embrulha os sentimentos em folha de papel manteiga. Dos que escutam a história alheia como uma epopeia. Dos que sofrem com os outros mesmo estes muitas vezes nem saberem que estão sofrendo. Sei que não deveria cobrar nada, mas às vezes é duro, muito duro e o mínimo que se quer é compartilhar mimos, atenções generosas, flertes com o nada que é tudo quando se está em comunhão de espíritos. Enfim, são delicadezas mínimas que fazem a alma revigorar. Não. Não vou. Porque sou birrenta. Rebelde. Saliente: acho que estamos nos de-se-qui-li-bran-do... E o dia torna-se mais arrastado. Todo torto. Solitário. Silencioso. Charlotte dorme: como é bom ser gato - já combinei com ela, na próxima encarnação, ela é que será a minha dona! Sento em frente do computador, começo a trabalhar. Como o dinheiro tá curto... Aí eu recomeço: querida, sempre foi assim! A vida continua mansa mansa... Como sementes de feijão aconchegadas no algodão. Começo a rir da minha rabujice! Toca o telefone, vou até o quarto, na parede de casa, no mural de recados, encontro a seguinte frase: A esperança é como âncora para a nossa vida (HB: 6, 19). É início de noite, atendo o telefone que nem para mim é. Anoto o recado, enquanto a frase na parede ainda está inaudível. Ligo a televisão e espero o dia de amanhã.
terça-feira, 4 de agosto de 2009
Já se sentiram assim?
Tudo! Tudo e mais. Dentro de si. Enquanto, cava-se, cava-se adentrando-se em seu próprio mundo subterrâneo. A denúncia? O brilho dos olhos que confessa a exuberância de estar próxima à natureza selvagem.
segunda-feira, 27 de julho de 2009
Together Through Life - Bob Dylan
Howdy Neighbor" (J. Morris) – Porter Wagoner & The Wagonmasters
"Don't Take Everybody to Be Your Friend" (M.Gabler/R. Tharpe) – Sister Rosetta Tharpe
"Diamonds Are a Girl's Best Friend" (L. Robin/J. Styne) – T-Bone Burnett
"La Valse de Amitie" (O. Guidry) – Doc Guidry
"Make Friends" (E. Mcgraw) – Moon Mulligan
"My Next Door Neighbor" (J. McCain) – Jerry McCain
"Let's Invite Them Over" (O. Wheeler) – George Jones & Melba Montgomery
"My Friends" (C. Burnett/S. Ling) – Howlin' Wolf
"Last Night" (W. Jones) – Little Walter
"You've Got a Friend" (C. King) – Carole King
"Bad Neighborhood" (Caronna/M. Rebennack) – Ronnie & The Delinquents
"Neighbours" (M. Jagger/K. Richards) – The Rolling Stones
"Too Many Parties and Too Many Pals" (B. Rose/M. Dixon/R. Henderson) – Hank Williams
"Why Can't We Be Friends" (S. Allen/H. Brown/M. Dickerson/J. Goldstein/L. Jordan /C. Miller/H. Scott/L. Oskar) – War
domingo, 26 de julho de 2009
DOMINGO...
O CORAÇÃO...
sexta-feira, 24 de julho de 2009
UNIVERSO CASA...
terça-feira, 21 de julho de 2009
O QUE NÃO SE ENCAIXA NUNCA EM NADA - por isso genial!
The Official Tim Burton Gallery
now open at http://timburton.com/
Deem uma olhadinha, vale a pena!
BALBULETEANDO por Lucélia Guimarães
Estou ainda sob o efeito da criação do balbuleteando, onde queriamos (Ariane, Le e eu) exprimir no convite o que aguardavámos desse momento. Senti necessidade de escrever para extravasar esse sentimento que me atormentava, no bom sentido. Mostrar o universo “casa” (tema do convite), cada canto, cada símbolo, cada significado...
Assim como Proust temos um espaço que nos separa por instantes, por horas, do mundo, de nós mesmos, mas temos também o que nos uni...a cafeteira (pausa para um café) representa um pouco isso, como também as refeições, os momentos dedicados aos filmes, às conversas “desprovidas” de cientificidade, mas permeadas pela ânsia do entendimento. Colocadas para fora numa palavra, numa frase, que pode ser o que nos alegra ou o que nos aflinge: será a busca pela compreensão, diante de tanta incompreensão; será a busca por acolhida, diante de um mundo indiferente...será a busca por entendimento?
Após o intervalo, retornamos ao nosso isolamento, que logo, logo ou a qualquer momento pode ser interrompido pela CHARLOTTE, a Charli, a Cha, a Gorda pedindo atenção, comidinha ou uma massaginha. Ela tem o poder de quebrar a tensão, o estresse, o cansaço...quando se joga na cama com o barrigão pra cima, Nossa Senhora de Nazaré proteja!!!!, o silêncio é quebrado por gargalhadas...ela é CAPAZ de DERRETER qualquer CORAÇÃO. Em tão pouco tempo de convivência fui seduzida, sou seduzida, sou apaixonada por ELA. Ela também faz parte desse universo “casa”.
Esse universo representa um pouco do que é, do que está sendo, do vir a ser dos que nela habitam. Sendo um pouco do que somos ou do que cada um é, e nesse caso, do que sou e, que me estimulou a escrever, a precisar expressar em palavras o que o balbuleteando me causou...
segunda-feira, 20 de julho de 2009
Charlottando...
domingo, 19 de julho de 2009
CAT POWER
De início, estava resistente: "Magina! Não é para tanto, já gostei muito, mas agora, blablabla...". Como no conto de Clarice Lispector, Felicidade Clandestina, fingi que não vivia aquilo para de tempos em tempos me surpreender com tamanha felicidade. Ah, essa minha alma tímida!
Como estava feliz! E os motivos eram tantos: ela, sua banda: Dirty Delta Blues, a minha história pessoal que foi regada a Cat Power durante cinco anos ininterruptos, pois quantas vezes não fiquei ouvindo Covers Records deitada na cama? You are free lavando louça ? Jukebox no trabalho? Moonpix na balada? Estava realmente emocionada.
A Luciana, com quem eu fui, disse que fiquei imóvel o show inteiro, que pendi para os lados, no máximo, duas vezes: ora para me debruçar à mesa, ora para me encostar à cadeira.
Ai, ai. Lembro-me de ficar escrevendo, no chão da sala, no meu apto. da Monte Alegre, as letras de músicas que não vinham no encarte, mas que eu as pegava na internet. Corria ao dicionário e traduzia um trechinho aqui, outro ali. Recortava figuras, para compor ainda mais a arte.
Nossa! E ia até a Augusta, ou a Velvet encomendar os cds importados. Cheguei a aprender a tocar duas musiquinhas no violão, fora o orgulho que tinha de ter uma franja como a dela!
O show foi demais. Eram as luzes vermelhas, azuis, a vela sobre o órgão, a guitarra, a bateria e ela - desculpe a analogia cafona, mas verdadeira - parecendo uma loba andando pelo palco, pois ficava toda encurvada, saltitava e... uivava!
De início, ansiosa, esperava um hitzinho qualquer, para confirmar o quanto sou sua fã, mas as coisas foram acontecendo de modo diferente. Por não conhecer algumas músicas do seu último EP Dark End of the street, me permiti ainda mais ficar perscrutando a atmosfera que ia sendo criada.
Pois é. Aconteceu de verdade. Ontem, como um caleidoscópio, lembranças da minha história de vida, as músicas, a Chan Marshall (cheguei bem pertinho dela), as luzes, a penumbra quebraram a resistência de quem ama e fingi não amar: "Magina! Não é para tanto, já gostei muito, blablabla..."
sexta-feira, 17 de julho de 2009
Impaciência Guimarães Rosa (Magma)
Eu queria dormir
longamente...
(um sono só...)
Para esperar assim
o divino momento que eu pressinto,
em que hás de ser minha (meu)...
Mas...
e se essa hora
não devesse chegar nunca?...
Se o tempo,
como outras cousas todas,
te separa de mim?!
Então...
ah!, então eu gostaria
que o meu sono,
friíssimo e sem sonhos
(um sono só)
não tivesse mais fim...
II
Se eu pudesse correr pelo tempo afora,
vertigniosamente,
futuro adiante,
saltando tantas horas tediosas,
vazias de ti,
e voar assim até o momento de todos os momentos,
em que hás de ser minha!... (meu!)
Mas...e se esse minuto faltar
nas areias de todas as ampulhetas?...
E se tudo fosse inútil:
a máquina de Wells,
as botas de sete léguas do Gigante?!...
Então...ah!, então eu gostaria
de desviver para trás, dia por dia,
para parar só naquele instante,
e nele ficar, eternamente, prisioneiro...
(Tu sabes, aquele instante em que sorrias
e me fizeste chorar...)
terça-feira, 14 de julho de 2009
1 SARAU BALBULETEANDO
ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas.
1o. SARAU BALBULETEANDO
domingo, 14 de junho de 2009
CAMINHANDO...
"Tudo no mundo está dando respostas, o que demora é o tempo das perguntas".
Não sei onde parei, mas sei que devo continuar, a preciosidade da Vida é um convite para quem abri-se a ela, primeiro, aceitando-a do jeito que é, sem julgamentos, sem vitimizações, depois o recomeço de novas ações que nos trazem mais vida à vida e portanto, felicidade.
terça-feira, 5 de maio de 2009
Linguagem
Quando não se tem verbo,
o caos recomeça-ruindo;
por isso profissão de fé -
letreira.
Foi a maneira que encontrei
para falar da experiência,
Na linguagem, repouso
a consiciência que por
alguns segundos presumi-se
fazer parte de algo seguro.
Só que tudo é transformação.
Então escrevo: devir, devir.
E a palavra me acolhe no som,
no sentido. Permito.
terça-feira, 7 de abril de 2009
quinta-feira, 2 de abril de 2009
SONHO
Sozinho, num quarto de pensão, o homem dormia escondido, desviando-se de tudo e de todos, fazendo deste momento, uma hora e meia antes do encontro com a namorada, um refúgio das solicitações menores e maiores de sua vida. Ou melhor, das dos outros, pois sabia – e no fundo todos sabiam – que nunca participava de algo que precisasse botar o coração na massa. Coisas simples: passa em casa! Gostaria que conhecesse uma pessoa... Podemos ir juntos, o que acha? Flores? Eu gosto!... Estendendo uma lista de ausências comprida. Desse modo, de tanto insistir, o povo o deixou ser o que queria: um cara bacana, que todos desejavam o bem, mas demasiadamente sossegado. Vamos respeitá-lo, não?
Pedro chegou a dar aulas de História no público e no privado, iniciou um mestrado e para sua surpresa, nos últimos anos de estudo da graduação, inclinou-se à historiografia contemporânea a ponto de desejar estudar a vida íntima dos operários da Barra Funda do início do século passado, especificamente, seus horários de lazer, e, foi assim, na busca de delimitação de corpus, que conheceu a pensão de Dona Alice: janelas que entram sol. Paredes descascadas. Um vaso de gérbera logo à entrada. Cheiro de carne de panela.
Sentiu-se extremamente motivado a mudar-se para lá - Talvez, ficar durante o tempo da coleta seja interessante! Não encarou isso como uma excentricidade, refletiu sobre a distância da pensão às escolas, nas quais lecionava e se desanimou, pois teria que acordar muito cedo, mas então, ao olhar uma morena de cabelos compridos, olhos amendoados, usando um vestido florido verde atravessar a entrada da pensão, perguntando a Dona Alice se havia chegado alguma correspondência, subitamente, encorajou-se a mudar.
Aconteceu que com o tempo foi ficando cada vez mais difícil chegar às escolas no horário, o mestrado, no décimo sétimo mês, estava lhe exigindo demais – estava atrasado nas leituras, não encontrava tempo para a organização dos instrumentos de coleta, do mesmo modo que lhe faltava sujeitos que se dispusessem a ser entrevistados – e Melina, a morena que avistara no dia em que se decidiu mudar, estava lhe cobrando atenção devida, pois havia deixado o namorado do interior para ficar com ele. Assim, Pedro pensou novamente em mudar de casa para se dedicar aos estudos, mas após analisar o que lhe incomodava de fato, resolveu deixar o mestrado e as aulas, negociaria uma demissão para receber o seguro desemprego e resgataria seu fgts, enquanto procuraria um bico no próprio bairro, evitando as queixas de ausência de Melina, a mulher que tanto amava! E assim foi durante três meses, inclusive o casal chegou a planejar um casamento e foi nesse período que lhe pareceu imprudente assumir uma relação. Pedro começou a não voltar para casa depois do trabalho – era vendedor de livros em um sebo. Melina, cansada, retomou os contatos com os seus no interior e para lá voltou, casando-se com o seu ex-namorado.
“... É-a-da-ta-de-nas-ci-men-to-de-Bo-ris-Schnai-der-man. U-cra-ni-a-no-que-che-gou-ao-Bra-sil-aos-oi-to-a-nos-e-le-é...”. A revista antiga o aborreceu, queria ler ensaios sobre os autores russos, não o panorama da literatura atual, gostaria de ler as biografias, as quais contassem coisas banais da vida do artista, para que a genialidade pudesse visitá-lo naquela tardezinha e iluminasse o ordinário. Era um jeito de se aproximar do belo. Mas nada encontrou nesta leitura, e, como facilmente se entediava, jogou a revista de lado para levantar-se da cama, calçou os sapatos, desceu até o supermercado que ficava no mesmo prédio que a pensão, mas na parte térrea, a qual dava para calçada.
Acho que vou chegar mais cedo ao encontro... Marina nem é tão bonita assim, antes, seu charme compensava, mas de uns tempos pra cá, tá tão sem graça, as mesmas brincadeiras infantis, que por sua vez a torna ridícula, pois já tem 35 anos. Não combina e isso me faz lembrar o quanto ela é solitária, carente. O que posso fazer? Me agride! Será que ela me ama porque sou o que sou, ou porque não há mais nenhum outro que a deseje? Quando a conheci, estava com um carinha... Mas que tipo de cara era esse? Respeitável?
Acho que vou comprar chocolates... Estou com saudades de Marina.
Na gôndola de doces, enquanto escolhia o chocolate, sentiu algo tocar-lhe as pernas, pensou que fosse algum animal, cachorro, gato, ao olhar para baixo, viu que era uma criança, um belo garotinho de cabelos encaracolados, deveria ter uns seis anos de idade, seus olhos eram grandes e divertidos, certamente confundira Pedro com o seu pai, mas mesmo reconhecendo que aquele não o era, ali ficou, sorrindo, preso às pernas do estranho. Gosta de doces?
- Não acredito! Pedro?, disse um homem corpulento, barbudo, que aproximou-se da criança e a pegou no colo.
Pedro ficou calado por alguns segundos olhando o estranho, até que no mesmo momento que se lembrara dele – um colega de mestrado – retraiu-se com vergonha:
- Marcos?
- Puxa, rapaz! Quanto tempo! Você sumiu, disse que ia mudar de cidade, para o sul, ajudar o seu irmão, não é?
Com uma barra de chocolate nas mãos, Pedro evitava olhar para o colega, aliás, não se lembrava de ter dito aquilo, provavelmente inventara essa história para se livrar de cobranças.
- É. Voltei o ano passado...
- E o que tem feito?
- Feito? Estou pensando em retomar o mestrado – tossiu, para encobrir o nervosismo – e por enquanto, estou trabalhando em um sebo aqui perto. Eu e mais um amigo...
- Sócios?
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-Gostaria do endereço, preciso comprar uns clássicos e no sebo, geralmente, é mais em conta, apesar de que... Dependendo do sebo...
- E você, o que tem feito?
- Olha para isso! – e com o filho no colo, passou a mão na cabeça do menino . Cresceu, né? Dá um trabalho e gasta, nossa! Mas viemos ao mundo para dar o lugar para os nossos continuarem, não? Tenho dado aulas no pós, sou orientador, escrevo umas coisas aqui, outras ali, às vezes freelo em uma editora, dou assessoria a centros de documentação, enfim, tudo orbitando nas questões do trabalho...
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-Esse chocolate é pro seu filho?
- Não. Não tenho filhos.
- Casou?
- Não. Não.
- Namorando?
- Sempre.
- Ei, Pedrão! Bom, vou nessa que o filhote já está impaciente.
Abraçaram-se, Pedro despediu-se da criança com um beijo em sua mãozinha e como um búfalo que vai se tornando minúsculo no horizonte a distância de seu observador, Marcos foi sumindo da vista de Pedro, encaminhando-se ao caixa, brincando com o seu filho que estava choramingando.
De volta ao quarto, Pedro olhou para o relógio, faltavam cinquenta minutos, comeu o chocolate, deitou na cama e resolveu cochilar um pouco, daria tempo de chegar ao encontro, não tinha preocupação quanto a isso, pois Marina sempre chegava atrasada. Tirou os sapatos, puxou o lençol e deitou-se de bruço, estava se sentido estranho, o encontro com o amigo o pertubara, a sensação era de descrédito para com todos, começando com ele mesmo, depois com o amigo, com o filho do amigo, Marina, seu quarto – Jamais retomarei o mestrado, um porre! -, as revistas de literatura, o sebo, D. Alice, a História, o chocolate... E como uma névoa de inseticida, as sensações, os pensamentos e as lembranças, foram aglutinando-se e pulverizarando tudo que estava relacionado à sua vida. Encolheu-se, sentindo-se extremamente cansado, fechou os olhos, adormeceu e sonhou:
Uma mulher de cabelo comprido, grisalho, usando galochas imbricava-se entre as árvores do quintal. Era finalzinho de tarde, fazia frio mesmo havendo sol, que mais servia para desenhar um tapete de luz e sombra na terra, do que aquecer.
Dentro do quarto, ele calçava seus sapatos, admirou-se de já estar vestido, será que havia dormido de roupa? Olhou para escrivaninha ao lado, aproximou-se, havia livros de etnografia abertos, com anotações no canto da página, logo acima máscaras africanas, assim como fotos de crianças sobre bicicletas. Sentiu-se extremamente feliz, sabia que aquilo tudo era seu, olhou para trás, havia uma ampla cama de casal e sentiu falta de alguém, descobriu-se casado e amando, foi até o criado-mudo e pegou o porta-retrato, no qual havia uma foto preto e branca de um jovem casal, uma brisa gélida entrou pela janela, as cortinas esvoaçaram à semelhança de garças elegantes, na sacada, o barulho delicado de um mensageiro do vento.
A mulher da foto era linda, cabelos compridos, escuros, seu olhar era brilhante como de uma criança ansiosa a ganhar um presente, conheceram-se na casa de amigos em comum.
Ele acabara de mudar para aquele país, ainda estava aprendendo francês, ela,liberta, comunicativa - o que colaborou para que se apaixonasse imediatamente : Como fala francês bem! E riu de si mesmo, porque era óbvio que ela falava bem francês, era francesa – fez com que se aproximasse daquela jovem de cabelos longos, que usava um casaco xadrez , o qual provavelmente era de sua época de adolescência. Seu nome, Jeanne. Ela pintava, tirava fotos e, despretensiosamente, trabalhava em uma boulangeries, fazendo tortas.
Desceu as escadas que davam para o hall de entrada, estava com saudades dela, parecia que não a via há anos, atravessou a sala, acendeu algumas luminárias sem deixar de admirar a decoração aconchegante da casa até que, apertando os passos, desembocou no quintal, no qual havia um amplo jardim – amoras silvestres, uma densa grama escura, pequenos abacaxis plantados rente ao chão, arbustos, tomateiros, dentes - de –leão, alamandas – e trôpego, tirou de sua frente uma espreguiçadeira, que atrapalhava a passagem para ir ao encontro de sua esposa.
- Onde está?
Ela foi se aproximando silenciosa, com o rosto um pouco sujo e em suas mãos, segurava ervas-daninhas.
- Está chorando de novo? Não gosto de te ver assim, se continuar desse jeito, teremos que fazer alguma coisa...
- Ressucitar meu filho?, bravejou, jogando as plantas no chão.
Fazia um ano que haviam perdido um de seus filhos, o caçula, eram férias e o jovem nem precisou insistir muito para passar uma temporada com seus amigos na Espanha, partiu com apenas uma mochila nas costas. Três dias depois , o casal recebeu um telefonema, era uma senhora que com muita dificuldade falava francês, disse que o menino – le garçon – estava no hospital. Correram até lá e receberam a notícia do falecimento, a altura do rochedo até o mar era demasiada, a água recuou e a morte foi imediata.
- Adianta ficar assim? Seus outros filhos estão sentindo a sua falta, seus netos... Vamos fazer geléia agora?
Colocou os braços ao redor de seu pescoço, Jeanne chorava, limpou as suas lágrimas e beijou seu homem.
- Vamos deitar um pouco nas espreguiçadeiras? A noite adentrava, seria um refrigério para suas almas ficarem ali, juntos. Com duas tristezas no seu coração: a dele e da mulher que amava, ele fixou o olhar nas galochas de sua esposa e rapidamente muniu-se de toda coragem para enfrentar a vida: Como era um enorme prazer estar ao lado dela! Enquanto seus amigos escolheram doutoras, modistas, psicanalistas, ele havia encontrado um tesouro maior: uma pequena incansável que lia madrugada a fora Peter Pan para seus filhos, rindo com eles, divertindo-se, mas também a ponto de tirar férias da família, quando a impediam de sê-la, no início isso pareceu assustador, mas se era para ele continuar a ter aquele brilho nos olhos – e assim o era – deveria partir para voltar, e de fato ela ficava fora uma semana, pegava o barquinho e passava tardes na lagoa ali perto, onde tinham à margem uma pequena cabana, falavam por telefone e dali mesmo ela dava instruções de como arrumar os uniformes dos meninos todas às noites, para que eles ao levantarem já os vestissem.
- Às vezes , me culpo pela morte dele, acho que nunca deveria ter saído de perto, digo com relação às minhas férias – e quando pronunciou essa palavra, prolongou-a para tirar qualquer peso que pudesse massacrá-la.
- Nunca ouvi tanta besteira de uma vez só!
Beijaram-se. As luzes das lamparinas das salas foram apagadas, balbucio de crianças ecoavam dos cômodos da casa.
Pedro acordou sobressaltado, da rua vinha um barulho, sonolento, permaneceu deitado alguns segundos: Que sonho estranho! Confuso, levantou-se lentamente, foi até a janela, olhou para baixo: dois meninos andavam de bicicleta, voltou para cama, sentou-se à beira, ficou ali, coçando a cabeça, fisgando algumas imagens do sonho: a esposa, seu quarto, o filho que morrera. Quem seria ela? E aquele outro Pedro que desconhecia? O país distante, o corredor, a vida que era sua, desejada, com todas as suas pegadas, o porta-retrato... A mulher. Sentiu saudade daquilo que não teve, ou teve? Está por perto? Não havia ninguém por perto: as revistas espalhadas no chão, o encontro com Marina, que não amava e que infelizmente, ambos sabiam disso. Que horas são? Teria que sair de casa imediatamente, mas não havia forças para isso, a solidão o cercara, talvez ligasse para o irmão que morava no sul, olhou para o telefone, levantou e decidido foi atrás dos seus:
- Quem fala?
- Beto.
- Beto? Que voz de homem, rapaz!
- Quem é?
- Teu tio de São Paulo, Pedro, lembra?
- Tio? Claro! Quanto tempo? Como tá?
- Bem. Estou com saudade de vocês.
- Saudade? Não sabe da maior: vou prestar vestibular para História, acredita?
- História? Vai virar professor , é?
- Não sei ainda o que vou virar...
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- E o que tem feito?
- Caído no mar! Como sempre!
- Caído no mar?
- É pegando onda, essas coisas...
- Gosta do mar...
- Muito tio.
- Tome cuidado, não é perigoso?
- Claro que não!
- Sei...
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- O pai tá por ai?
- Acabou de sair da oficina, tá procurando funcionário, o que tínhamos saiu ontem...
- E como anda o resto?
- Minha mãe? Tá bem.
(riram ao mesmo tempo)
- Ligo amanhã para falar com teu pai.
- Ok.
- Boa sorte no vestibular. Parabéns pela escolha.
- Certo...
Desligou o telefone, como seria fácil ir ao encontro de Marina se não tivesse tido aquele sonho, como seria fácil de estar ao lado dela se não tivesse ouvido seu sobrinho falar que iria prestar História, se não soubesse o quanto aquele amava o mar e se não soubesse que houve e havia possibilidades invisíveis ao seu redor, mas que, por pura crueldade a si mesmo nunca as amou e ainda não as ama. A noite iniciava, Pedro colocou os sapatos e saiu do quarto ao encontro de sua namorada. Estou com saudades.